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Noticias de Washington

Uma Expansão do Bem-estar Humano Discurso Proferido pelo Dr. Raj Shah, Administrador da USAID

Conferência sobre Democracia, Direitos e Governação 2.0
Arlington, VA
20 de Junho de 2011

A história que define a Primavera Árabe é contada por Mohammed Bouazizi, o jovem vendedor de fruta tunisino que se imolou pelo fogo em protesto pela humilhação de que tinha sido alvo nas mãos da polícia local.

Num acto de desespero – uma explosão figurativa que se tornou literal – ele lembrou-nos que, bem no fundo de todas as almas, reside um desejo de autodeterminação e a sua dignidade subsequente. E deu início a uma reacção em cadeia que mudou o mundo que conhecemos.

O gelo do Inverno autoritário que dominou o mundo árabe durante tanto tempo finalmente começou a derreter-se. Embora os manifestantes no Egipto, Líbia, Bahrein, Yemen e eventualmente na Síria tenham enfrentado uma resistência mortal aos seus apelos à liberdade, a Primavera Árabe tinha começado.

É uma história possante, com eco em todos nós, quer crie a nossa empatia ou nos mobilize para a rua. Mostra o poder que o acto humano individual tem de provocar uma mudança global e a nível de gerações.
Mas há mais em relação à história tunisina.

A história de Bouazizi não menciona as centenas de pessoas envolvidas nos protestos que acorreram aos escritórios do Presidente da Câmara Municipal imediatamente depois de ele ter ateado o fogo. Não destaca o seu debate interno em que gritavam "Dignidade antes do pão!" depois de passarem para o apelo anticorrupção: "O trabalho é um dever, seus ladrões."

Não descreve o destemor demonstrado pelos manifestantes quando a polícia tunisina disparou contra eles, nem os milhares de jovens bloggers, nem os cineastas amadores que usaram os seus telefones celulares para documentar esta violência e organizaram manifestações através do Facebook.

E não menciona Rachid Ammar, o general comandante do Exército tunisino que se recusou a dar ordens às suas tropas para dispararem contra os manifestantes concentrados na capital. No dia seguinte à decisão corajosa do General Ammar, o Presidente Ben Ali fugiu.

A história mais ampla – de apoio aos anseios de liberdade e dignidade do povo, de determinar o rumo de progresso, de usar a tecnologia para unir o povo, de dar poder aos líderes para assumirem posições corajosas – é o tema que eu gostaria de abordar hoje.

Na qualidade de voz representativa do povo vulnerável em todo o mundo, acredito que a USAID pode e deve desempenhar um papel mais amplo.

O Presidente Obama e a Secretária de Estado Clinton deixaram bem claro que será política dos Estados Unidos promover as reformas e as transições democráticas. Em resultado disso, devemos trabalhar no sentido de dar maior importância à autodeterminação e dignidade humana na nossa política externa e na nossa abordagem em relação ao desenvolvimento.

Durante anos, uma crítica feita à assistência prestada pela USAID foi que trabalhávamos muito de perto com governos que se recusam a respeitar os direitos dos seus povos …
…que temos estado do lado de regimes, limitando o nosso investimento na sociedade civil ou na promoção da democracia de modo a não contrariarmos parceiros estratégicos…
…que fomos cúmplices em relacionamentos desiguais entre autocratas e os seus povos.

Estas críticas têm algum mérito.

Apesar de sermos o maior apoiante da democracia, direitos e assistência à governação no mundo, continuamos a agir como se a democracia e o desenvolvimento fossem dois objectivos diferentes.

Porque tememos que a ortodoxia pró-democracia limitará a nossa capacidade de trabalhar em países com líderes repugnantes, priorizámos o crescimento económico.

E embora tenhamos sido corajosos em países como o Zimbabwe, noutros onde governos estrangeiros limitaram o âmbito da nossa promoção da democracia, direitos e governação, trabalhámos nas margens.

Mas como o Presidente deixou claro no seu recente discurso, vivemos num novo mundo, com um novo paradigma de interesse nacional que se identifica melhor com os nossos valores nacionais.

Não podemos contar com a estabilidade insustentável dos autocratas, nem limitar a nossa assistência a grupos que contaram com o apoio dos governos. Pelo contrário, procuraremos conseguir uma reforma democrática real como forma de promover a paz e de dar aos povos a última palavra em relação ao seu próprio destino e desenvolvimento.

O trabalho da USAID deve reflectir um entendimento mais profundo das palavras "apropriação do país." Ao invés de equiparar um país ao seu governo, devemos estabelecer parcerias mais estreitas com uma grande variedade de intervenientes: parlamentos, partidos da oposição, sociedade civil e, um aspecto particularmente crucial, os próprios cidadãos.

Mais do que qualquer outra Agência ou Departamento, o nosso principal relacionamento com os países estrangeiros é com os seus povos, quer atribuamos poder a uma rapariga no Afeganistão para que possa frequentar a escola pela primeira vez, quer providenciemos abrigo a uma família no Haiti.

Esse nível pessoal de interacção dá-nos uma vantagem significativa para que possamos entrar no longo jogo da reforma política. Ao trabalhar no sentido de atribuir poder aos cidadãos e de moldar instituições e estruturas do poder ao longo do tempo, podemos apoiar a aspiração de uma pessoa para a autodeterminação e dignidade de uma forma que as outras instituições não podem.

Essa é uma vantagem que devemos defender em todos o países em que trabalhamos ajudando os cidadãos a manifestarem o seu desejo de liberdade, a organizarem-se de acordo com as suas crenças, a divulgarem os seus pontos de vista e, em última instância, a elegerem os seus líderes.

Mas para se poder participar efectivamente nesse jogo de longa duração, devemos ultrapassar algumas das tensões injustificadas que existem entre o desenvolvimento e a democracia, integrando as melhores lições de cada numa abordagem unida.

Não nos devemos envolver em debates que duram décadas sobre se a democracia ou o desenvolvimento devem avançar primeiro; sobre a dignidade antes do pão ou o pão antes da dignidade. Tal como a Primavera Árabe nos recordou, a prosperidade económica e a liberdade política devem andar de mãos dadas.

Isto não quer dizer que a democracia é necessária para o crescimento económico – ignorando a experiência da China e do Vietname. Mas para cada país que consegue crescer rapidamente sem abraçar a democracia, existem cinco ditadores que relegam os seus países ao desespero económico e político.

Mesmo que nas ditaduras se registe o crescimento, este pode ser assustadoramente desigual. Ao longo da última década, o rendimento per capita da Guiné Equatorial cresceu mais rapidamente do que qualquer outro país, até mesmo que a China. No entanto, mais de 70% da sua população ainda vive numa pobreza extrema.

O crescimento que não seja de base ampla ou equitativo, que dê poderes aos seus líderes para maltratarem o seu povo, que enriquece oligarquias e se esquece dos pobres é apenas uma estatística com pouco peso no bem-estar dos cidadãos.

Por exemplo, em todo o mundo assistimos a ganhos espectaculares na mortalidade infantil e materna nos últimos 15 anos. Um maior número de mães tem um parto seguro e mais crianças conseguem viver mais do que o quinto ano de vida do que em qualquer outro momento da história.

Mas os raros países que não conhecem esse progresso, todos eles têm uma coisa em comum: são ditaduras. Já não podemos tratar com seriedade de problemas como a mortalidade infantil ou a fome sem a vontade de confrontar a corrupção e a autocracia.

Não digo que isto seja fácil. A nossa indústria está cheia de incentivos que se destinam a manter o fluxo dos dólares da assistência, até mesmo para os países onde a corrupção mina a sua eficácia. Muitas vezes, os esforços que visam retirar o apoio numa tentativa de condicionar a assistência são recebidos com críticas.

A Millennium Challenge Corporation e o Departamento de Desenvolvimento Internacional do Reino Unido têm trabalhado com vista a mudar esta percepção, enfatizando que a assistência produz melhores resultados quando vinculada a exigências de fortes reformas democráticas e de governação.

Este é o movimento que iremos adoptar na USAID. Se quisermos ser um apoiante credível do crescimento e progresso sustentáveis – se esperamos alargar as oportunidades às pessoas a quem servimos – então devemos trabalhar com vista a apoiar a democracia e a aquisição de poder económico. Devemos ajudar os países a praticar a democracia com um dividendo.

Praticar a democracia com um dividendo significa derrubar a muralha que já existe há muito tempo entre os profissionais de desenvolvimento e os peritos em democracia, direitos e governação.

Venho do mundo do desenvolvimento e vivi e testemunhei as lutas travadas pela nossa comunidade para adoptar e sublinhar a importância da democracia, direitos e governação no nosso trabalho.

Os profissionais de desenvolvimento devem entender que sem instituições públicas capazes, transparentes e que possam ser responsabilizadas …
…sem a estabilidade política ou direitos de propriedade …
…sem combater a corrupção e o suborno…
…sem reduzir o risco do investimento que os parceiros do sector privado enfrentam …
…o nosso trabalho de desenvolvimento não poderá obter os resultados sustentáveis que procuramos obter.

Agora, qualquer olhar atento ao nosso orçamento irá revelar que em muitos países que enfrentam sérios desafios democráticos e de governação, o grosso da nossa assistência destina-se às nossas iniciativas presidenciais: principalmente a Feed the Future e a Global Health Initiative.

Mas não devemos deixar que esse cenário orçamental signifique que devemos ocultar a necessidade de expandir a democracia, direitos e governação.

Melhorar a qualidade das instituições públicas, aumentar a responsabilização do governo, combater a corrupção e dar aos cidadãos a oportunidade de votar pela queda de líderes ineficazes são aspectos cruciais do combate à pobreza, eliminando a fome e melhorando a saúde.

Sem a reforma política, não estamos a contribuir para o desenvolvimento dos países; estamos a prestar serviços, minando as nossas possibilidades de obtenção de sucessos a longo prazo.

Por isso, devemos ter um espírito inovador na maneira como atribuímos o nosso financiamento para que possamos apoiar as estruturas de governação necessárias para acelerar e sustentar a aquisição do poder económico.

Aqui, o PEPFAR pode servir de modelo útil. No Quénia, uma doação do PEPFAR foi utilizada para formar, orientar e prestar apoio contínuo a jornalistas visando educar o público em métodos eficazes de prevenção e tratamento do HIV.

Estes jornalistas utilizaram vários tipos de media – escrita, fotografia, rádio, televisão e novos órgãos de comunicação – para transmitirem a sua mensagem com eficácia. Com o andar do tempo, amadureceram e tornaram-se em alguns dos melhores jornalistas do continente.

Estes mesmos jornalistas cobriram a eleição presidencial disputada no Quénia, bem como a crise política que se seguiu utilizando as habilidades que tinham aprendido para chamar a atenção do mundo. Hoje, três deles são candidatos ao prémio de Jornalista Africano do Ano da CNN.

Não só os investimentos activos na democracia, direitos e governação oferecem um apoio imediato aos objectivos preconizados pelas nossas iniciativas de desenvolvimento, como também podem prevalecer, apoiando a liberdade e a transparência a longo prazo.

É por essa razão que hoje anuncio um segundo financiamento no âmbito das nossas iniciativas Presidenciais. Utilizando os recursos que já afectámos às Iniciativas, iremos criar um novo canal de financiamento formal para disponibilizar recursos destinados à democracia, direitos e programação da governação com o objectivo de melhorar a sustentabilidade e a eficácia destes esforços.

Na Etiópia, estamos a fazer com que a governação democrática seja uma parte central da nossa estratégia Feed the Future. Sabemos que a gestão eficaz da terra e dos recursos naturais não apenas incentiva o crescimento agrícola, como também reduz as tensões e confere poderes aos cidadãos.

E no Ruanda, a nossa Global Health Iniciativa está a trabalhar no sentido de conseguir uma maior transparência do sistema de saúde do país. Ao abrigo do programa de financiamento baseado no desempenho a nível nacional, as unidades sanitárias devem submeter pedidos de pagamento pelos serviços que registam nos processos dos doentes. Os membros da comunidade trabalham com o Ministério da Saúde para verificar se as pessoas realmente receberam os serviços solicitados.

Por criar expectativas e eliminar a possibilidade de fraude, esse simples acto de verificação obteve ganhos significativos no acesso aos serviços de saúde. Constatámos imediatamente um aumento de 23% de partos institucionais nas unidades sanitárias que participaram na iniciativa.

Porque os ruandeses confiavam nos seus médicos, foram mais vezes às suas consultas.

Da mesma maneira que a nossa carteira de desenvolvimento deve ser informada pelo nosso trabalho de democracia, direitos e governação, também o nosso trabalho de democracia deve reflectir as melhores lições de desenvolvimento sustentável.

A lição mais crítica é que os nossos esforços devem ser baseados em evidências e estar sujeitos à avaliação. A ideia de que a aquisição do poder democrático é, de certo modo, demasiado intangível para se conseguir medir, demasiado complexa para basearmos em dados ou em evidências ou demasiado pura para fugir do escrutínio é falsa.

Ao avançarmos, o nosso trabalho na área de democracia, direitos e governação irá medir o desempenho para determinar o que de facto resulta; confiar nesses dados para obter os melhores retornos possíveis; proteger o poder da ciência, tecnologia e inovação para acelerar o progresso; e sermos capazes de redireccionar se acharmos que está a ser ineficaz.

Em consulta com os nossos parceiros do Congresso, prevemos lançar um novo Centro de excelência da democracia, direitos e governação que se deverá tornar no centro de pesquisa no terreno baseada em evidências.

Já temos uma certa ideia de que o investimento na democracia, direitos e governação pode alterar a trajectória democrática de um país. Um estudo por nós encomendado em 2008, efectuado pela Universidade de Pittsburgh e Vanderbilt, demonstrou que por cada investimento de $10 milhões feito pela USAID na expansão da reforma política, vimos um aumento mensurável no volume de mudanças democráticas que um país poderia esperar com base nos indicadores da Freedom House.

Mas nós queremos aprofundar esse entendimento. O que o MIT Poverty Action Lab (Laboratório de Acção contra a Pobreza do MIT) tem feito para a eficácia do desenvolvimento, o nosso Centro de Excelência pode fazer para a eficácia democrática.

Vamos convidar académicos de renome de uma série de áreas, nomeadamente cientistas políticos, sociólogos, médicos e economistas, para trabalharem connosco com o objectivo de estudar, analisar e avaliar a eficácia das nossas iniciativas e programas, usando esses dados para moldar a nossa programação.

Vamos recorrer cada vez mais aos dados da pesquisa de opinião pública, usando as exigências das populações para moldar as nossas estratégias, programas e avaliações.

A primeira tarefa do Centro será proporcionar uma análise abrangente global da democracia, direitos e governação a médio e longo prazos dos países que constituem uma prioridade para nós para que possamos integrar esses resultados nas estratégias do nosso país.

Vamos trabalhar em estreita colaboração com a nossa equipa no terreno, os nossos colegas da inter-agência e os nossos colegas no Capitólio para fazer do Centro um recurso compartilhado eficaz.

O Centro também vai desempenhar um papel fundamental nas reformas a nível das aquisições da nossa agência, desde analisar os efeitos da nossa assistência directa visando garantir que os nossos parceiros de implementação obedeçam aos padrões de responsabilidade e comportamento. Por exemplo, devemos conseguir assegurar que todos os nossos contratados e subcontratados cumpram regulamentos rigorosos anti-tráfico ou enfrentam sérias consequências.

Este trabalho tem sido muito informado pela nossa história de trabalhar na prevenção do tráfico de pessoas. Há mais de dez anos, estabelecemos uma parceria com a MTV no sentido de criar a MTV EXIT – uma ampla iniciativa multimédia destinada a combater o tráfico de mulheres e raparigas para exploração sexual.

Através de documentários, anúncios de serviços públicos, redes sociais e até mesmo de vídeos de música, a MTV EXIT produziu mensagens vivas e comoventes sobre a tragédia do tráfico de seres humanos.

A partir desse primeiro compromisso, ajudámos a expandir o programa a nível mundial, ao mesmo tempo que ampliávamos a sua ênfase. Hoje, na Ásia o programa incide sobre o tráfico de mão-de-obra e o trabalho forçado, além do tráfico sexual.

A MTV EXIT chega agora a 300 milhões de lares em todo o mundo e levou a uma maior colaboração entre as ONG e governos nos esforços de combate ao tráfico nos países de todo o mundo.

A MTV EXIT também constitui um grande exemplo do uso de abordagens inovadoras e novas formas de comunicação para ajudar as pessoas de todo o mundo a comunicar ideias, sensibilizar e expor atrocidades.

No Azerbeijão, em resposta ao controlo quase completo por parte do governo dos meios de comunicação tradicionais, mas onde existe o livre acesso às novas media, estamos a investir na construção de centros de Internet de alta velocidade irrestritos em todas as universidades e aldeias do país, para que os cidadãos possam criar o seu próprio conteúdo novo. Estes centros dão aos cidadãos deste país a liberdade de ler notícias objectivas e expressar as suas próprias vozes on-line e, simultaneamente, desenvolver as habilidades dos jovens do país.

Quando visitei a Índia no ano passado com o Presidente Obama, tive conhecimento de um programa patrocinado pela USAID, que incentivou os estudantes a usar telefones celulares para combater o absentismo dos professores.

Quando os professores não comparecem à escola – uma situação demasiado comum nos países em desenvolvimento – os alunos enviam uma mensagem de texto para a administração da escola local. Esta medida contribuiu para reduzir drasticamente o absentismo, tendo passado de 25 por cento para apenas três por cento.

Mas não pode haver melhor exemplo de maximizar o poder da tecnologia para responsabilizar os governos do que Videre, um parceiro que se junta aqui a nós hoje. No seu trabalho inovador, Videre usou os órgãos de comunicação social para expor a violência política e étnica e os abusos dos direitos humanos.

Reconhecendo que o soldado mais poderoso na luta pelos direitos humanos tem uma câmara, e não uma arma, Videre formou cidadãos para documentar, divulgar e partilhar filmagens de abusos e atrocidades, sensibilizando e envergonhando os governos até que tomem medidas.

Ao oferecer esta abordagem integrada entre o desenvolvimento e a democracia, podemos garantir que a nossa assistência contribua para expandir os direitos e melhorar a governação, criando as bases para a mudança democrática.

Mas devemos reconhecer que a nossa assistência também pode levar a consequências indesejadas. A assistência pode tornar-se numa renda – muito semelhante à riqueza de recursos – do tipo que cria incentivos para limitar o progresso ou retarda a reforma política.

Temos a responsabilidade de limitar o potencial dano da nossa assistência. Como parte da USAID Forward, efectuamos uma avaliação do risco financeiro para analisar o nosso auxílio de governo para governo. Este não é apenas um exercício de contabilidade; no Malawi, optámos por não disponibilizar verbas para os ministérios do governo porque não tínhamos como garantir que elas chegassem às pessoas que pretendemos servir.

Vamos expandir essa avaliação de modo a incluir uma análise do impacto da assistência de governo para governo da USAID na liberdade democrática, gestão das finanças públicas, transparência e direitos.

Esta verificação do crédito democrático irá determinar se o nosso investimento poderia fortalecer um governo à custa do seu povo. Se assim for, vamos explorar opções para redireccionar o nosso financiamento em torno do governo, através de outros parceiros.

E assim como vamos oferecer ao Malawi apoio para melhorar a sua prestação de contas, também iremos fornecer aos governos o apoio de que necessitam para melhorar a sua responsabilidade democrática.
Alguns podem achar que essa proposta é controversa.

Mas temos de continuar a envolver e incentivar os líderes dos governos para que busquem liberdades mais amplas. Numa altura em que muitos países em desenvolvimento estão a registar um crescimento de dois dígitos, a ideia de que podemos incentivar a reforma unicamente através da condicionalidade não é realista.

Devemos descobrir novas maneiras de incentivar e apoiar o comportamento que nós promovemos, e não simplesmente condenar e limitar o comportamento de que não gostamos.

Uma organização empenhada em incentivar a boa liderança é o Africa Governance Institute, liderado por Tony Blair. Reconhecendo que a má governação nem sempre é uma questão de intenção, mas muitas vezes de capacidade, o Instituto trabalha para apoiar os governos, ajudando-os a identificar prioridades, a agir em função delas e a expandir o alcance da reforma.

A partir deste ano, iremos financiar uma parceria entre o Instituto e o Governo da Serra Leoa. Esta assistência vai ajudar o Presidente Koroma a fortalecer as instituições do seu país, ao mesmo tempo que aprofunda a sua liderança.

Em última instância, a nossa assistência não é nenhum substituto da liderança necessária para conduzir a reforma. Devemos promover, construir e estimular a liderança para que os governos tenham uma oportunidade realista de oferecer resultados.

E temos de perceber que os líderes estrangeiros enfrentam uma enorme pressão para satisfazer múltiplos grupos, ao mesmo tempo que operam com capacidades e recursos limitados. Entender esta realidade política complexa vai nos ajudar a moldar a nossa assistência de forma mais eficaz. Tal como o Primeiro-ministro Blair disse, "Se perdermos a política, perdemos o ponto."

Estou ciente de que o meu apelo de hoje não é fácil de implementar. Durante décadas, uma abordagem integrada da democracia e trabalho de desenvolvimento e uma abordagem racional em relação ao estabelecimento de parcerias com os governos iludiram a nossa comunidade.

Mas hoje, a Primavera Árabe deu-nos uma oportunidade sem precedentes para atender às aspirações e respeitar a dignidade das pessoas cuja liberdade foi negada durante uma geração.

Para desempenhar esse papel, será necessário reconhecer algumas verdades duras sobre o ritmo do progresso e o âmbito do que pode ser realizado.

Em vez de sobrestimar drasticamente o que podemos fazer a curto prazo – que podemos conseguir a democracia amanhã – o enfoque da USAID incidirá a médio e longo prazos, priorizando as nossas oportunidades de criar democracias vibrantes. Vamos trabalhar em estreita colaboração com as pessoas da região para moldar as instituições e construir os mecanismos de controlo e fiscalização que irão apoiar o seu futuro político.

Esta abordagem reflecte muito do que aprendemos na Europa Central e Oriental depois de 1989. Apesar do trabalho bem sucedido em países como a Polónia e a Estónia para expandir a governação democrática, a transformação ainda levou anos, com várias desilusões ao longo do percurso. A redução das despesas, o sucesso dos partidos políticos comunistas e ultra-nacionalistas e, claro, a violência étnica e o genocídio fizeram as suas cabeças.

Os países que se confrontaram com crimes do passado conseguiram expandir o Estado de Direito, criar um melhor relacionamento com os vizinhos regionais e melhorar a governação local e a transparência. A instituição estatal da Polónia sobre a memória histórica – moldada com base na Alemanha – ajudou a inspirar uma imprensa livre vibrante, enquanto o Presidente Medvedev reconheceu recentemente que os fantasmas do passado ainda assombram as tentativas de modernização da Rússia.

Nos países de todo o Médio Oriente, já estamos a testemunhar repressões brutais. Em democracias incipientes, desenvolver partidos políticos coerentes, resolver reclamações e superar as divisões internas constituirá um enorme desafio. E quando os países que passaram por revoluções realizarem eleições abertas, provavelmente veremos partidos estadistas ou islâmicos a terem sucesso nas urnas – um resultado quase predeterminado por ditaduras do passado.

Reconhecendo que as sementes da revolução podem levar anos ou mesmo décadas a florescer, devemos fazer o que estiver ao nosso alcance para garantir que um dia, elas realmente floresçam.

Na Tunísia, devemos olhar para a experiência da Estónia, um país cuja adopção de direitos democráticos, inovação e e-governo levaram a um rápido crescimento e à adesão à UE e à NATO.

Com condições semelhantes, um pequeno país com uma população altamente escolarizada e uma tolerância dos direitos religiosos e das mulheres, a Tunísia tem a oportunidade de se tornar num modelo de democracia para o mundo árabe e numa base sólida para a mudança na região.

O nosso governo, incluindo a USAID, vai desempenhar um papel sustentado no sucesso da transição do país, dando credibilidade à fonte de inspiração da Primavera Árabe. Vamos trabalhar em estreita colaboração com governos, parceiros, fundações privadas e funcionários da Europa do Leste para partilhar a sua experiência com o povo da Tunísia.

Já estamos a adoptar esta abordagem no Egipto, onde a USAID patrocinou uma delegação de peritos em transição do Chile, Roménia e Sérvia para consultar líderes políticos e activistas cívicos.

Também vamos continuar a introduzir reformas na nossa ajuda para que se concentre na capacitação do povo do Egipto, estendendo a nossa parceria para um número muito mais amplo de ONG e grupos locais.

Vamos abraçar a sociedade civil e ajudar as pessoas a se envolverem directamente no processo político, apoiando as reformas constitucionais e a aquisição de poder pelas mulheres e jovens.

Na Líbia, onde os Estados Unidos se juntaram a uma coligação internacional para evitar um massacre iminente, vimos a oposição lançar um conselho interino legítimo e credível. Nos últimos dois meses, equipas da USAID foram a Benghazi com o objectivo de avaliar as necessidades actuais deste governo emergente. O nosso trabalho hoje vai solidificar uma transição significativa para a democracia quando Gadafi for forçado a abandonar o poder.

Enquanto os Estados Unidos e a USAID trabalham para reorientar a nossa assistência para o Médio Oriente e o Norte de África, muitos perguntam-nos sobre o prémio final da Primavera Árabe.

É fácil olhar para a expansão da democracia e do progresso que ocorreu na Europa do Leste e imaginar um futuro semelhante: uma região que seja pacífica, próspera e livre.

Mas embora pensemos no prémio de transição democrática em termos grandiosos, não devemos perder de vista o que significa uma maior dignidade e liberdade para o indivíduo.

Os profissionais de desenvolvimento – eu próprio incluído – acabam sendo vítimas de definir o bem-estar humano apenas em termos do PIB, da fome, ou da mortalidade. Tão grande é a nossa paixão de alargar as oportunidades para as pessoas viverem vidas saudáveis e produtivas que acaba ofuscando a nossa apreciação da liberdade política.

Eu sei o quão profunda é a minha preocupação quando vejo uma criança faminta, ou uma menina doente com HIV. Eu sei o quão furioso fico quando tenho que testemunhar esse sofrimento muito concreto e muito desnecessário. Penso nos meus próprios filhos – os três jovens, os três saudáveis, os três com um potencial ilimitado – e pergunto por que razão não podemos oferecer essa mesma oportunidade em todo o mundo.

Mas parto do princípio que a oportunidade dos meus próprios filhos está garantida não apenas por uma vacina ou uma boa educação, mas pelo facto de eles crescerem numa sociedade livre e justa...

... que se forem injustiçados, podem procurar reformas ...

... que se forem maltratados, podem protestar ...

... que se os seus representantes não corresponderem às suas expectativas, podem votar contra eles e retirá-los dos seus cargos.

Está claro nos rostos dos manifestantes no Cairo e Damasco, Teerão e Rangoon que a maior dor de todos não pode vir da doença ou da fome ... mas de um sonho adiado.

A maior raiva pode não surgir de um campo agreste, mas de cidadãos indefesos.

A maior dor pode não vir de uma doença evitável, mas de uma alma que anseia por respirar liberdade.

Devemos lembrar que quando investimos num pequeno agricultor no Uganda, investimos num empresário com um interesse crescente numa sociedade livre. Quando ajudamos uma mãe a dar à luz em segurança, expandimos a sua participação no futuro. Quando apoiamos os direitos dos cidadãos de votar contra um líder corrupto, estamos a ajudá-los a afirmar a sua dignidade.

Se pudermos expandir o nosso compromisso com os cidadãos, se pudermos integrar com sucesso a democracia, os direitos e a governação na nossa carteira mais ampla de desenvolvimento e se pudermos aproveitar a oportunidade importante apresentada pela Primavera Árabe, então podemos conseguir produzir resultados desta compreensão mais verdadeira do bem-estar humano.

Obrigado