Estão seguramente péssimas, que o défice continua colossal. E este recente objectivo que o governo se auto-impôs em cortar 4 bi na despesa de 2014 (ou já em 2013 se os juízes do TC voltarem a decidir em causa própria) peca por brando. Com o défice previsto para 2013 (se o Orçamento se cumprir) a rondar os 7,5 bi e a necessidade de reduzir o volume da dívida pública que no final do ano ultrapassará largamente os 120% do PIB, o objectivo para os cortes estruturais deveria ser o triplo. Curiosamente (ou talvez não) o limite máximo dos cortes sugeridos pelo FMI no seu tão diabolizado Relatório ronda os 12 bi.
Mas se as contas ainda estão más, a tendência é nitidamente virtuosa. Nunca nenhum governo fez tanto em tão pouco tempo e pela via mais saudável e estruturante, a redução da despesa. Em menos de 2 anos, operou uma redução de 15,3 bi na despesa primária, metade dos 30.000 milhões que me parecem ser o objectivo de médio prazo que o governo deveria ter formulado no dia da sua tomada de posse.
Ah e tal, mas essa redução deve-se ao corte dos subsídios na função pública! – tal é a réplica asinina e ignorante quando se fala no relativo sucesso no corte da despesa (digo relativo, porque muitos cortes não são estruturantes). Acontece que o corte dos subsídios em pouco ultrapassou os 2 bi, menos de 20% do corte total já realizado, que foi transversal, atingindo todas as rubricas da despesa. Mas deve referir-se, já agora, que o móbil do corte dos subsídios foi precisamente a redução da despesa…
É curioso que quando a imprensa e comentadores do regime repetem até à náusea os erros das previsões do Gaspar, procuram transmitir a ideia de uma completa derrapagem orçamental, nunca se apontando os números do défice nem que ele baixou em 2012, não obstante a queda das receitas fiscais. A tal ponto, que se vêem nas redes sociais responsáveis políticos a denotarem uma total ignorância (ou má fé?) quanto a números e a total convicção de que o défice subiu. Na realidade, em 2012 o défice terá baixado cerca de 4 bi. (note-se que os valores subjacentes ao gráfico acima apresentam os “défices reais” sem a recorrente maquilhagem contabilística das receitas extraordinárias, designadamente a “nacionalização” de fundos de pensões ocorridas em 2003, 2004, 2010 e 2011 e a projectada receita de 1,2 bi em 2012 com a concessão da ANA).
Mas o problema de fundo não estará tanto na dimensão dos cortes, que agitam sobretudo os interesses instalados, que têm sempre os media disponíveis para lhes amplificarem os protestos. A questão verdadeiramente estruturante está na Constituição que temos e respectivos “guardiões” do TC, as novas “forças de bloqueio” que inviabilizam qualquer saída da crise. A subida da despesa prevista para este ano, fundamentalmente pela reposição de um dos subsídios, já é o resultado desse “impasse constitucional”. Passos Coelho terá antecipado esse risco, mas amedrontou-se com a histeria mediática que então provocou.